Colecção de palavras com origem no Fundão.

Na tentativa de desenhar relações entre o agora e o antes, tropeço na minha própria língua, tecendo coincidências entre realidade e ficção.
A palavra, mais do que actividade verbal, compõe os contextos que habitamos. De corpo em corpo, ocupa uma esfera imensamente pública, deitando-se sobre diferentes prismas de interpretação. Como uma teia intrincada, talvez comparável a um vírus, esta evolui formando uma paisagem metamórfica na qual significâncias se renovam e reajustam. Agora, vivo cá fora e o português já não flui da mesma forma. Possivelmente será por essa razão que me desafio a revisitar este tema.

Convite à criação de Notas de Rodapé

Utilizando o número da palavra a que se refere, deixa um pequeno escrito, imaginado ou citado, espontâneo ou meticuloso, desprendido ou de pé atrás.
A par e passo, todos os dias serão também lançadas notas de rodapé pessoais, tecidas a partir de apontamentos, conversas, impressões e histórias que recolhi durante a residência Realidades Submersas, em parceria com o Museu de Arqueologia do Fundão. Foram cinco as ocasiões em que visitei o Fundão no âmbito deste projecto, que pretende fazer convergir as práticas da investigação da arqueologia e da criação artística.

 

4 Um primeiro gesto, museológico, inseparável de uma autoridade cartográfica. Uma senhora que cavava o seu terreno encontrou uns objectos reluzentes. Guardou-os, muito bem guardadinhos, dentro de uma lata. Foi então arrumá-la no sítio mais seguro que conhecia: de volta à origem, nas profundezas da terra.

1 «Escava nesse lugar. Não deslizes para outro sítio. Duplo, triplo fundo das coisas.» Robert Bresson

2 “(…) mais de metade daquela casa é feita de menires.”

3 Digo: como qualidade da memória, talvez o tempo. Mas, demorando um dia a relembrar um dia, um estudo não poderá processar-se dessa forma. Por vezes demora um ano a relembrar um dia. E como poderá um tempo amnésico, invocar a memória? E assim, num processo calendárico que nada pode ter a ver com o tempo, resta o espaço.

1/4 Na pro-funda PHOTO ROSEL um homem enraizado exclama, com quase toda a certeza, que “troca o que sabe pelo que não sabe.”

1 Eco-audível, por oposição a peça-muda; talvez o ponto tenha sido acrescentado, mas algum fundo terá o conto.

2 O meu vizinho acredita que debaixo da casa onde cresci existe um tesouro antigo escondido durante a guerra.

5 Vejo no lembrar um acto de cuidar. Pensar em origens, etimológicas ou arqueológicas, pertencerá a esse mesmo acto. Estará o homem habituado a cuidar? Talvez melhor a mulher, facto interessante ter sido esquecida do lembrar.

 

Participação da artista no canal Horizonte da plataforma – Buraco negro.
www.buraconegro.ar-s.org