Elizabete Francisca

bio
Nasce em Joanesburgo, África do Sul. Licenciada em Design Industrial (ESAD-CR), estudou dança no Fórum Dança (PEPCC) e na Escola Superior de Dança de Lisboa. Desde 2009 o seu trabalho tem-se centrado na área das artes performativas, tendo participado em diversos projetos como colaboradora artística, bailarina, performer e atriz. Trabalhou com Vera Mantero, Loic Touzé, Ana Borralho & João Galante, Tânia Carvalho, Mariana Tengner Barros, Mark Tompkins, Meg Stuart, Miguel Pereira, Vânia Rovisco, Rita Natálio, Tonan Quito, Carlos Manuel de Oliveira, Carlota Lagido e Marília Rocha entre outros. Do seu próprio trabalho destaca os duetos criados em colaboração com Teresa Silva “Leva a mão que eu levo o braço” e “Um Espanto Não Se Espera”, ambos vencedores do concurso Jovens Criadores; e o solo “TSUNAMISMO, recital para duas cordas em M”. Foi artista associada da estrutura Materiais Diversos dirigida por Tiago Guedes entre 2011-2013. Atualmente é apoiada pela estrutura O Rumo do Fumo, de Vera Mantero e faz parte do colectivo de artistas da Apneia Colectiva.

 

a besta, as luas
Residência de criação no Campus Jardim das Pedras, Feital, 2019.

Através de gestos e sons, proponho enunciar, uma representação possível da geografia política de um corpo não submisso.

Num momento onde tantos corpos e tantas vozes dificilmente podem existir, é urgente reivindicar um lugar de resistência, transformando possíveis fragilidades em flechas e potências. O corpo como arma política, o último reduto de qualquer experiência, um grito. De afirmação de uma individualidade, em reconciliação com a sua identidade e sexualidade: do​ sexo à cabeça, da cabeça ao cosmos, do cosmos ao chão. Uma possível reza em linha recta para nos mantermos de pé.

Criação Elizabete​ Francisca Interpretação Elizabete​ Francisca (ou Vânia Doutel Vaz) Concepção​ sonora e operação ao vivo Kino​ Sousa Figurino​ Carlota Lagido Produção ​ Elizabete​ Francisca e​ O Rumo do Fumo Agradecimentos​ Associação​ Luzlinar/ Projecto Pontes, A Casa do Burrikórnio, Damas Bar, Carlos Manuel Oliveira e em especial a Julia Salem

Duração aprox. 30 min​

 

 

[texto escrito durante o processo de criação, a 25 de Setembro de 2019, que situa alguns dos “porquês” desta dança.]

Iniciei este trabalho num momento bastante conturbado, uma tal crise planetária, que engloba uma crise ecológica e das energias, uma crise generalizada das democracias e uma crise económica mundial em ascensão. Contudo, e parafraseando os Comité Invisível, todas as épocas são orgulhosas, cada uma se vê como única, e isso aguça o prazer de viver uma época sem igual. O tempo de vida de cada um de nós, pelo menos na forma que a conhecemos, parece-me demasiado curto para se poder entender no seu absoluto esta humanidade e o seu percurso: os suas falhas, as suas vitórias, os seus hábitos de operação, as suas terapias de choque, os seus ciclos ou o chamado eterno retorno​​.

Assistimos a uma ascensão generalizada de movimentos de extrema direita, e com eles a justificação e a validação de posições e manifestações cada vez mais acentuadas de fascismo, machismo, xenofobia, homofobia, transfobia. Muitos -​ ias e -​ ismos​: infelizmente sabemos que a lista é bem longa para palavras tão assustadoramente mortais. E sabemos que muitas destas catástrofes não nos afectam​​. Não há nem pode haver uma real afectação,​ simplesmente porque os aparelhos com que mediamos o mundo são ecrãs. Somos os existencialistas superequipados com o seu smartphone​​, essa sofisticada​ aparelhagem da ausência. Ou não seriam essas mesmas janelas virtuais aquilo que paradoxalmente nos dá a sensação de controle e poder – porque estamos informadas – mas que, e ao mesmo tempo, nos distancia de tudo. Tamanha acumulação de natureza tão distintas, que gera uma não assimilação, uma não digestão.

E eu, estou aqui. Mais que incluída, nesse regime de afectações​​:

Estávamos no último período de eleições presidenciais no Brasil. Jair M. Bolsonaro, figura realmente execrável subia ao poder, e com ele proclamava-se e proclamar-se-á uma guerra à diferença, à multiplicidade, à livre expressão e à justiça, contribuindo para a continuidade de desastres humanos e ambientais. Certamente, foi pela minha vivência naquele país, por essa familiaridade com os lugares e com as pessoas só possível através da experiência directa, que este acontecimento se me tornou íntimo. Político e íntimo, com ou sem ecrãs. Vi e ouvi muitos amigos, mas também muitos estranhos a terem de fugir. Fugir para outros lugares, para outros países. Fugir daquelas ruas, que quase mais nada podem oferecer, a não ser violência. “Sair para a rua, todos os dias, a qualquer hora, é como ir para um campo de batalha, é saber que podes não voltar mais” – diziam-me. Ora por defenderem uma democracia, ora por serem mulheres ora por pertencerem à comunidade LGBT, estavam condenados. O seu corpo e a sua voz estavam condenados. Aqueles corpos e aquelas vozes deixaram de poder existir. E nestes desastres, surgem movimentos de resistência, que reivindicam o seu lugar​ de fala, e ​que utilizam e transformam fragilidades em força e potência. Artistas como Elza Soares, Karol Konka, Flora de Matos, Johnny Hooker, Os Não Recomendados, Luedji Luna, Liniker e Linn da Quebrada, iniciam através da música e da performatividade um movimento incendiário de revolta e afirmação usando o seu corpo como território. Corpo como uma verdadeira arma política, ou não seria afinal, o corpo o último reduto de qualquer experiência. E se é nele que se pode rever verdadeiramente as consequências de um sistema, é através dele que se pode reverter processos e por isso realidades. Uma transição exterior (entendo aqui, aquilo que nos rodeia), só é possível com e a par duma transição interior. Esse desmantelamento, esse colocar em questão contínuo, das nossas ideologias, ideias e certezas.

Imbuída destas forças, forças​ porque sensíveis, ​e da evidência que regimes de afectação​ criam necessidade e por isso verdade,​ ​a urgência em me posicionar enquanto artista, mas também como mulher jovem bisexual que sofre violência é uma evidência.
As desigualdades, o fosso criado entre as pessoas é um grande problema.
A desigualdade de género é um grande problema.
O sistema patriarcal é um grande problema.
E neste domínio, o maior será talvez, a impossibilidade de cada um estar plenamente em reconciliação profunda com a sua identidade e sexualidade. Essa intimidade que nos permite aproximar​ do mundo e por isso fazer mundo.

O meu corpo é o meu território.
Do sexo à cabeça, da cabeça ao sexo, e da cabeça ao chão.
Uma possível reza em linha recta para nos mantermos de pé.

 

Dias Contados
Residência para a peça coreográfica, Fundão, 2020

 


Créditos António MV

 

Recebi a carta. Abri a carta. Li a carta. Fiquei parada de pé.

(…)

Olhei em volta. Não há outro mundo, há apenas uma outra maneira de viver.

Praças, ruas, estabelecimentos vazios de sentido. A cidade moderna, o exército anónimo do progresso, implacável na devastação como a sua única salvação. Pessoas sem casa, expulsas, empurradas para um sítio qualquer. Uma crise habitacional que não é mais do que uma luta de classes. Trocam-se as cores, limpam-se os destroços, reabilita-se. Substitui-se a população, os mais pobres pelos mais ricos. O fosso social alarga-se perpetuando a tensão. Não ter direito a uma casa, a um sítio que nos devolva quem somos, é algo de profundamente desestruturante. A paisagem modifica-se, demolição silenciosa da memória patrimonial e afectiva, que poucos podem acompanhar. A especulação. Há prédios a arder, há bullying, há mortes. Longe daquele que tem os mais altos muros e as fachadas mais fechadas.

Já se sabe: a crise é um modo de governo, a verdadeira catástrofe é existencial e metafísica e a revolta e o pensamento são-nos forças inalheáveis.

Até lá rios secam, árvores são dizimadas, espécies que passam só a existir em livros, plástico no ar, novas doenças. E os supremos que tentarão refugiar-se sempre no seu condomínio de luxo, ao abrigo de tempestades e evidências.

Elizabete Francisca
12 de Janeiro de 2020

 


Oaxaca, México, 2006 (“Eles querem obrigar-nos a governar, mas não vamos cair nessa tentação”)
AOLX, Lisboa, 2017 (“Não somos especuladores/ Somos espectaculares”)

 

Eu sou só mais uma

ONDE A BOCA SE ABRE NUMA NÃO-RECUSA E NUM SIM-DESEJO
ou
[texto esboço de uma realidade em construção, numa mistura entre o público e o privado, o macro e o micro, o real e o projectual, por às vezes já ser, alegremente tão difícil discernir].

Eu sou só mais uma que recebi uma nota de despejo.
(…)
Eu sou só mais uma que recebi uma nota de despejo.
Eu sou só mais uma a ter de encontrar alternativas, desenterrar alternativas, inventar alternativas, suar alternativas, expropriar-me em vários sentidos. Encontrar nesse desequilíbrio uma rede sustentada, sustentável. Talvez essa, grandemente, a da troca directa: de bens, de serviços, de afectos, de tempo. Devir todo, devir comum.
(…)
Sou só mais uma a perder acesso àquele restaurante, àquela mercearia, àquele miradouro onde um espetáculo de som e luz gratuito e ao ar livre acontece todos os dias: flashes em campo de batalha se esgueiram no meio do barulho dos tuk-tuks a derramar turistas. Sou só mais uma a dar conta de um novo proprietário, a dar conta que o terraço popular da Pollux agora é o caríssimo LESS e que do café Estádio só resta a placa. Sou só mais uma a ouvir que “o problema agora é que isto não é para todos”. Sou só mais uma que vive debaixo de um hostel, num prédio em que as pessoas não dizem bom dia nas escadas e deixam a porta escancarada como se tudo isto, já fosse um resort qualquer.
Sou só mais uma a não conseguir apanhar o Eléctrico 28. E a subir a colina em manifestação de cólera desapegada numa calçada que já parece tudo menos portuguesa.
Sou só mais uma que ri (tontamente e inocuamente) com a expressão de uma moradora da Mouraria que diz já se considerar uma figura quase pré-histórica da zona. Ou ainda com o plano de contratação de figurantes para se fazerem passar de Lisboetas que deambulam pela cidade. Sou só mais uma que se espelha na Tânia Fortuna ao comentar o Debate sobre Habitação com os Candidatos à CML: “Sinto-me um pouco aterrorizada de cada vez que penso que quando for procurar novo arrendamento permanente vou deparar-me com uma tarefa hercúlea. Repito: aterrorizada.”
Sou só mais uma a ouvir a sinfonia de Lisboa composta por martelos pneumáticos, perfuradoras e despejos de entulho que se lançam através de formas plásticas tubulares. Sou só mais uma quase a ser atropelada pela carrinha Lisboa Aventura, Go Wild. Sou só mais uma a tentar desvendar qual a sucessão de ideias do Sr. Empreendedor que resulta no típico “O Mundo Fantástico da Sardinha Portuguesa”, que mistura um género de personagens de um Alice no País das Maravilhas com o Eduardo Mãos de Tesoura, numa espécie de feira popular instalada num barco pirata hipster.
Sou só mais uma a olhar para o rio Tejo e a pensar que para o ano, quando Lisboa receber o maior congresso de cruzeiros do Mundo, não vai conseguir avistar nem Almada nem o Barreiro. Sou só mais uma incrédula com esta estranheza do ser ocidental em relação ao mundo, que lhe exige ser amo e possuidor da natureza.
Sou só mais uma, e por consequência, dentro desta extensão desolada mediada pelo trabalho, por um histerismo superficial de existencialismos superequipados. Sou só mais uma a ver o smartphone como a perfeita aparelhagem da ausência. Sou só mais uma a viver um falso luto. (Não foi o mundo que se perdeu, mas sim os humanos.) Sou só mais uma dentro de um paraíso fiscal (que rima com infernal). E sou só mais uma agora a fazer fila no supermercado com a Madonna e com a Monica Bellucci.
Sou só mais uma portuguesa, que ouve de tantos outros jovens espanhóis e franceses (acima de tudo) a ripostarem que não percebem a inércia e o fatalismo dos daqui, mesmo em reuniões onde se dizem todos anarquistas. Sou só mais uma a dizer-se que é preciso muita atenção a coisas como fundamentalismos, conservadorismos, Lisboa-centrismos.
Sou só mais uma a fazer download do aplicativo GPS for the Soul.
Sou só mais uma que tantas vezes fica inerte mas a pensar que talvez o verbo seja des-começar e que provavelmente os recursos naturais estão menos esgotados do que os recursos subjectivos e vitais.
(…)
Eu sou só mais uma a ter de encontrar alternativas, desenterrar alternativas, inventar alternativas, suar alternativas, expropriar-me em vários sentidos.

O embrutecimento é da idade da pedra. E isto é tanto colectivo como o é na primeira pessoa.

[texto que integra o documento de descrição do projecto, por forma a ter apoios para o concretizar num futuro possível. Escrito em Outubro de 2017, Lisboa]

 


Francisco de Goya, 1799 (Los Caprichos: Y aun no se van)

Parc Humain

Este ano, durante o período de confinamento devido à pandemia da Covid-19 e à subsequente impossibilidade de retomar a minha actividade, concorri a uma bolsa de trabalho promovida pela Associação Parasita que pretendia responder a este período de imprevisibilidade, lançando um apoio “para artistas independentes das artes performativas converterem o seu trabalho criativo em tempo de análise, organização e catalogação dos seus arquivos pessoais.”

Mergulhei então no meu arquivo, a maior parte dele ligado à concepção de peças coreográficas. E esse mergulho permitiu-me olhar para trás. Olhar para a meu percurso, para essa constelação de experiências feitas de encontros com pessoas e com lugares, feita de projectos com seus desejos, suas questões e divagações. E olhar para os projectos, é olhar para os seus processos: cartas de intenções, textos e imagens de pesquisa, cadernos de notas, vídeos de ensaios, e tantos outros materiais que vão sendo produzidos, mas que normalmente ficam na invisibilidade em detrimento da apresentação de um objecto final, da escolha do que é tornado público ou não, daquilo que se torna o espectáculo.

Constato que há uma riqueza e uma complexidade que por vezes se perde neste processo, ou melhor, denoto que eu eventualmente tenha alguma dificuldade em processos de selecção, naqueles que se deve aprimorar por uma equação sólida, acutilante e até sagaz do que foi toda uma procura de outros saberes e de outros lugares. No entanto, todos esses desdobramentos mais ou menos divergentes ou aleatórios são fundamentais, são inerentes a uma procura. Marcam presença: existiram e existem como formas de rever obras e de as re-situar, e de sobretudo nos permitir entender um pouco mais quais seriam essas matérias de várias ordens que nos habitavam. Tanto por se afirmarem como profundos interesses num determinado momento, tanto por se poderem ainda afirmar como potências por vir.

Neste sentido, para esta exposição escolhi apresentar materiais que fizeram parte do processo de criação do trabalho “This Kiss to the whole world”(1), uma colaboração com Antonia Buresi e com Caroline Masini, Gérald Kurdian, António Mv e Carlos Ramos, com produção L´equipe de Nuit e co-produção de Collectivité Territoriale de Corse, Ville dʼAjaccio e O Rumo do Fumo.

A forma final espectáculo foi estreado a 23 e 24 de Março de 2013, em Ajjacio na Córsega, e nunca mais foi apresentado.

(1) Este título faz referência ao último fresco do friso” Sucession” de Klimt, realizado a partir da 9º Sinfonia de Beethoven.

Participação da artista no canal Horizonte da plataforma – Buraco negro.
www.buraconegro.ar-s.org

Parc Humain #1

É através do reinvestimento da força da nossa memória colectiva e de um corpo cuja dimensão mítico – poética tem o poder de resistir a uma instrumentalização das individualidades, que é possível re-situar o lugar do ser com a sua História e reinvocar uma experiência subjectiva: matérias iminentemente humanas, que são a via autêntica da nossa autonomia. Queremos substituir uma vertigem colectiva da abolição subjectiva* por uma vertigem colectiva interior e activa. * (Roland Gori, La dignité de penser, LLL, 2011)

No lugar da experiência radical da organicidade, da audácia dos nossos desejos e da iconografia das histórias e fantasmas, propomos uma vertigem colectiva. Uma certa calma. Um super poder.

Elizabete Francisca e Antonia Buresi, carta de intenções, 2012

 

Parc Humain #2

 

Parc Humain #3

 

Parc Humain #4

5

(como é que) O corpo e a suas emoções podem participar num pensamento político? Georges Didi-Huberman. Sempre que vou a um talho acho surpreendente não estar ali eu em vez do animal. Francis Bacon. Às vezes dói-me tudo que já nem me sinto. Elizabete Francisca. “A emoção não diz eu.” Deleuze. Tomai e bebei, este é o Meu sangue em memória de vós. Jesus. Est-ce que l’âme a un corps ? C’est le contraire, c’est le corps qui a une âme. Jean-Luc Godard. C’est qu ‘une fois nu, chacun de nous s’ouvre à davantage que lui. G. Bataille. Se domesticamos a Natureza, chama-se Parque, se domesticamos o Homem, chama-se Estado.  Rodrigo Garcia. On croit au chiffre comme une autre civilisation croyait aux esprits.  Roland Gori. Nem imaginamos o número de pessoas que pendurariam em casa um quadro de uma cadeira eléctrica, sobretudo se as cores da lona se harmonizassem com as cortinas. Andy Warhol. E à medida que chorava bebia água como se tivesse a sede do século dentro dela. Rita Natálio. C’était des larmes de quoi, on ne savait pas, de violence intolérable, des larmes d’amour. Claude Régy. Faire quelque chose de beau c´est faire quelque chose d’étonnant, et faire quelque chose d’étonnant c´est prende un risque. Desconhecido. Payer la liberté au prix de l’insignifiance, cela n’est pas cher. Alain Badiou. E eu continuo a puxar carrugem pesada mas sempre que levanto uma pedra espero encontrar um monte de formigas por baixo. Elizabete Francisca. AAAGRH,  gri BUM. Alguém do neolítico. Eu nunca grito, basta-me abrir os olhos. João César Monteiro. Os nossos desejos não cabem nas vossas urnas. Manifestante na rua, 2 de Março de 2013, Lisboa. Ne pas céder sur son désir. Jacques Lacan. Il est aussi dans l´intérêt d´un tyran de garder son peuple pauvre, pour qu´il soit si occupé à ses tâches quotidiennes qu’ il n´ait pas de temps pour la rébellion ! Aristóteles. Si l’humanité ne périt pas à cause d’une passion, elle périra à cause d’une faiblesse, que préfère-ton ? C’est la question essentielle. Nietzsche. Observe le troupeau qui paît sous tes yeux: il ne sait ce qu’est hier ni aujourd’hui, il gambade, broute, se repose, digère, gambade à nouveau, et ainsi du matin au soir et jour après jour, étroitement attaché par son plaisir et son déplaisir au piquet de l’instant, et ne connaissant pour cette raison ni mélancolie ni dégoût. Encore Nietzsche. Je veux être une torche vivante!  Antonin Artaud.  Sonhem! Fernando Pessoa. Da mesma forma que a dança mobiliza corpos a política também mobiliza corpos. Randy Martin. Le monde va changer de base, nous ne sommes rien soyons tout. L’Internationale. Le seul mot de liberté est tout ce qui m’exalte encore. Manifesto Surrealista.

Participação da artista no canal Horizonte da plataforma – Buraco negro.
www.buraconegro.ar-s.org

Cosmogonias

Parte da reflexão sobre a heterossexualidade como regime político, fundado através da escravização das mulheres*. Uma ideia que se assenta no questionamento não só da divisão e categorização de género, mas que também se impõe em termos de conflito de classe. Categorizações essas, que perpetuam sistemas de opressão sobre as mulheres e sobre comunidades à margem, como a LGBTQI+, e que inviabilizam a existência de comunidades cada vez mais interseccionais, múltiplas, justas e livres, na tentativa de, a cada dia, escaparmos a extremismos, a guetos, e sobretudo à violência.

Tomando estas questões como essenciais no pensamento de como construir uma corpa, e de como essa mesma corpa é apresentada política e socialmente, precisamos de espaço-manuseio-reflexão. COM TEMPO. (devo assumir que ocupamos um lugar de privilégio. Um espaço branco, à quem diga burguês. Então vamos a isso. Somos as precárias na nossa condição.)

Neste primeiro encontro, eu, a Daniela Rodrigues e o Kino Sousa, estaremos a olhar para tudo isto, de modo a  podermos ver as nossas próprias limitações. A Daniela é antropóloga, ilustradora, escritora e lê o que nos diz as borras do café. O Kino Sousa  é pesquisador. Profundamente pesquisador.  Faz-se no conhecimento entre o concreto e a sensação, daí ter-se tornado capaz de gerar música e som a partir de um movimento, de uma força maior.

Elizabete Francisca
15 de Junho de 2021